Por Francisco Homem de Mello*
Aqui, na Qulture.Rocks ,somos grandes fãs da Netflix e acreditamos que a empresa tem uma das culturas corporativas mais fascinantes do mundo. As culturas podem ser agregadas em alguns grandes arquétipos, como as de alto desempenho, camaradagem, diversão e culturas de formalidade e hierarquia (essas categorias são bastante fluidas, e não são de maneira nenhuma mutuamente exclusivas).
Dentre as culturas de alto desempenho, três se destacam bastante: a Bridgewater Associates, um fundo de investimentos americano, a AB InBev, cervejaria que conta com acionistas brasileiros (e uma filial muito conhecida no Brasil: a Ambev) e a Netflix, gigante do entretenimento on-line e único grande destaque do mundo de tecnologia e do Vale do Silício.
Mas, o que são culturas de alto desempenho? São culturas empresariais em que o baixo desempenho – não entregar resultados ou não agir de acordo com a própria cultura – são comportamentos pouquíssimo tolerados. Em outro extremo, podemos pensar no governo, onde a lei garante que colaboradores de baixíssimo desempenho tenham empregos garantidos para a vida toda.
As culturas de alto desempenho também têm um aspecto comum: são mais polêmicas, agradam a poucos, mas possuem fãs ferrenhos, que não as trocam por nada. As bases da cultura Netflix, em que o slide de capa original da apresentação de cultura deles é: “Liberdade e Responsabilidade”. A Netflix gosta de definir a sua cultura assim.
Como isso funciona na prática? Basicamente, a empresa acredita que é mais produtivo tratar seus colaboradores como adultos responsáveis, do que criar uma série de regras a respeito de como eles devem se comportar, “como se fossem crianças em uma escola primária”, nas palavras de Patty Mccord, ex-vice-presidente de Gente da empresa. Mas, como criar responsabilidade?
A cultura até hoje ‘peculiar’ da Netflix tem importantes desdobramentos quando falamos de práticas e políticas de RH
A Netflix acredita que a melhor forma de instigar essa responsabilidade nos seus colaboradores é, como falamos, tratá-los como adultos. O que isso significa na prática? Por exemplo, em vez de impor regras restritivas a respeito de como seus colaboradores devem tirar férias, a empresa prefere dar aos próprios colaboradores a autonomia para que decidam quantas férias devem tirar, usando seu bom senso e responsabilidade, e sabendo que têm metas e resultados para entregar.
Outro aspecto importante e interessante é a decisão da empresa de dividir praticamente todas as suas informações estratégicas com seus colaboradores. Acredita em comunicar claramente quais são seus desafios estratégicos, sejam eles concorrência, novos produtos ou expansões geográficas, e deixar que estes definam qual a melhor forma de atacá-los. Segundo Patty, “grandes culturas são criadas contratando gente muito talentosa e adulta, que queira nada mais do que superar grandes desafios, e então comunicar clara e constantemente quais são estes desafios”.
A cultura até hoje “peculiar” da Netflix tem importantes desdobramentos quando falamos de práticas e políticas de RH. Patty Mccord fala em seu novo livro, Powerful: Building a Culture of Freedom and Responsibility, que se deu conta de que práticas tradicionais de RH eram inadequadas: “…e mais importante, vi que as práticas tradicionais de RH eram baseadas em premissas falsas sobre os seres humanos: que a maioria das pessoas precisa receber incentivos externos para que realmente deem tudo de si no trabalho, e que precisam ter sempre alguém que as diga o que fazer. As ‘melhores práticas’ que foram desenvolvidas sobre essas premissas são, ironicamente, contraproducentes, pois desencorajam e tiram poder das pessoas”.
Uma das áreas mais impactadas é a gestão de desempenho, mais especificamente o processo de avaliação de desempenho da empresa. Não há notas, não há avaliação de metas nem competências, e não há um ciclo de tomada de decisões diretamente relacionado às avaliações de desempenho, que se resumem a um ciclo de feedback 360-graus que acontece algumas vezes por ano.