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Entre os resultados, o foco de T&D não acompanha as novas necessidades
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A tecnologia digital – não apenas, mas principalmente ela – está redefinindo com forma cada vez mais veloz os rumos do trabalho, de quem o executa e do lugar em que é realizado. Com isso,  a capacidade de mudar rapidamente – e com sucesso –  está se tornando mais crucial do que nunca e tem sido um grande desafio para as organizações. Definir o que fazer e como fazer não é tarefa simples. Foi justamente para mapear as transformações implementadas até o momento e os gaps existentes nas empresas que o Grupo Cia de Talentos uniu-se ao Great Place to Work (GPTW)  para realizar  primeira edição da pesquisa Empresas do Futuro.

Baseada em cinco pilares – Modelo de Negócio, Branding, Equipes, Modelo de Trabalho e Cultura de Aprendizagem – e 246 empresas respondentes de diferentes setores (69 de serviços, 63 indústrias, 35 de tecnologia, 30 comércio e varejo, 25 financeiro, 16 saúde e 8 de outras áreas), o estudo faz uma fotografia atual do mundo do trabalho e tem como missão apoiar empresas a darem os próximos passos na construção de um futuro mais significativo para pessoas e empresas.

A pesquisa será realizada anualmente, com o objetivo de acompanhar a evolução das empresas das organizações pesquisadas. Segundo Casimiro Perez, responsável pelo estudo no GPTW, o levantamento permitirá acompanhar as conquistas e apontar as principais oportunidades de melhoria que podem ser aproveitadas pelas empresas. “As mudanças não são mais escolhas e sim obrigação”, assinala.

E como construir a empresa do futuro? Segundo Danilca Galdini, responsável pela pesquisa e head de Insights do Grupo Cia de Talentos, essa é uma tarefa difícil e marcada por tentativa e erro, já que não existe um caminho certo – e muito menos um único caminho. “O desafio na transformação organizacional não diz respeito apenas ao futuro, mas também ao presente. É preciso construir o futuro, que promete ser bem diferente, enquanto entregamos o presente. As empresas precisam ser ‘ambidestras’, ou seja, precisam aproveitar o mundo que foi (para o qual elas estão preparadas) e explorar o que está sendo construído”, afirma.

MUITA REFLEXÃO, POUCA TRANSFORMAÇÃO
De acordo com os resultados, quando o assunto é o modelo de negócio, embora as empresas do futuro precisem ter modelos fluídos e com grande capacidade de adaptação, na prática isso parece não acontecer. Confira:

  • Sua empresa identificou uma grande oportunidade inovadora de negócio. Contudo, essa oportunidade acabaria se tornando uma ameaça para o negócio atual. Como você acredita que seria a reação? 

– Acho improvável que minha empresa estaria disposta a uma mudança radical do core business, portanto deixaríamos a oportunidade passar: 54%
– Faria um investimento mínimo de baixo risco, sem considerar uma mudança no modelo de negócio a curto prazo: 28%
– Repensaria o modelo de negócios e se prepararia para uma grande mudança a curto prazo: 18%

Já quando o assunto é o modelo de trabalho,  estruturas organizacionais flexíveis, que privilegiam a autonomia, a leveza, a agilidade e o pertencimento são cada vez mais demandados, as empresas mostram-se mais flexível:

  • Chegou a hora de dar uma promoção a um de seus melhores funcionários. Contudo, em vez de um maior salário, ele diz que prefere ser reconhecido recebendo um período sabático de 3 meses para poder viajar o mundo, algo que ele sempre quis fazer. Como você acha que seria a reação da maioria dos gestores na sua empresa?

– Conversaria com a alta liderança da empresa: 69%
– Negaria e ofereceria novamente a promoção. Porém, teria uma imagem negativa do funcionário: 15%
– Negaria o pedido e cancelaria a promoção: 5%
– Teria autonomia para liberar sabático e promoção: 5%

Já no que ser refere a branding, empresas do futuro investem na construção de uma marca forte e na relação transparente com seus stakeholders. Veja o que as participantes da pesquisa disseram sobre esse tema:

  • Chegou a seu conhecimento que um funcionário de alto escalão na sua empresa realizou algum tipo de comentário em público ofensivo a um determinado grupo (ex: mulheres, negros, LGBTs, idosos, migrantes, etc.). Qual é a atitude da sua empresa em relação ao funcionário?    

– Nenhuma, cada pessoa tem a liberdade de expressar a sua opinião: 11%
– Adverte o funcionário internamente, sem demais consequências: 50%
– Afasta o funcionário por um período, até “a poeira baixar”: 5%
– Demite o funcionário imediatamente e reforça os valores da empresa publicamente. 34%

Sobre diversidade e inclusão na contratação de pessoas, o foco está principalmente nos jovens. A pesquisa aponta que não existe interesse nas empresas em manter funcionários aposentados ou preparando-se para aposentar. Apenas 6% afirmam ter práticas que mostram que um funcionário aposentado pode continuar a fazer parte da força de trabalho. Por outro lado, são vistas iniciativas interessantes para manter os funcionários mais jovens por mais tempo nas empresas. Outro ponto importante de se observar é o gap entre desejo e realidade: 47% das empresas acreditam que uma pessoa abertamente trans poderia assumir o cargo de presidente sem problema algum, porém, estudos apontam que mais de 90% da população trans encontra-se excluída do mercado de trabalho formal. Executivos e executivas trans no Brasil podem ser literalmente contados nos dedos.

Ao se falar de equipes, as empresas do futuro estabelecem processos e estruturas que promovem a inovação e a transformação, bem como assumem que as pessoas têm papel central nesse cenário. Confira o cenário atual nas organizações entrevistadas:

  • Nas reuniões estratégicas da sua empresa, o tema “pessoas” fica em qual ordem da agenda/de prioridade?        

– É a primeira a ser discutida: 22%
– Meio da reunião: 44%
– É a última pauta a ser discutida, após o fechamento das principais decisões: 17%

Somente em casos excepcionais, como demissões, acidentes de trabalho, processos trabalhistas, etc.: 17%

No tocante à cultura de aprendizado, nas empresas do futuro, o protagonismo é estimulado e o aprendizado é colocado o estimulam o protagonismo e colocam o aprendizado como responsabilidade de toda empresa. Mas a pesquisa detectou o seguinte:

  • Suponha que sua empresa irá aplicar 10 treinamentos nos próximos meses. Qual seria a proporção esperada entre os seguintes tipos de treinamento?

– Técnico: habilidades e conhecimentos necessários para executar a função dentro da empresa – 2,12
– Executivo: gestão de pessoas, ambiente de trabalho, comunicação – 1,34
– Cognitivo: Lógica e raciocínio, resolução de problemas complexos – 2,76
– Comportamental: diversidade, mediação, inteligência emocional, ética – 3,78

Para os autores da pesquisa, o foco atual está nas competências erradas: tanto para desenvolver funcionários quanto para reconhecer o bom trabalho, as empresas ainda dão valor às competências mais técnicas. Embora essas vão sempre continuar relevantes, possuem um tempo de vida cada vez mais curto, uma vez que tecnologias, ferramentas, métodos e processos mudam em um ritmo nunca antes visto.

Inúmeros estudos apontam que as competências mais procuradas no futuro estarão relacionadas à solução de problemas complexos, adaptabilidade e ao constante aprendizado – ou seja, habilidades cognitivas e comportamentais. Esse ponto mostra o quanto as empresas ainda pensam no curto prazo: as competências técnicas preparam as pessoas para entregarem no aqui e agora.

Quando se fala em desenvolvimento de liderança, para 26% dos respondentes, tornam-se gestores aqueles que demonstraram liderança no papel exercício, mesmo quando não fazia parte da responsabilidade, e para 23% o tempo de casa tem grande peso. Ao olhar os dados considerando-se as competências técnicas/liderança, nota-se que 54% dos pesquisados escolheram alternativas relacionadas a habilidades técnicas como fator relevante para alguém tornar-se gestor e 46% selecionaram alternativas relacionadas a liderança como principal fator, o que pode ser preocupante. Um gestor deve sim ter excelência técnica, mas se este é o fator primordial na hora de decidir uma promoção, cria uma enorme quantidade de gestores despreparados para lidar com pessoas, o que destrói as relações de confiança entre colaboradores e organização.