Poucos líderes estão preparados para os desafios da gestão de pessoas, diz pesquisa
Estudo analisa também as tendências dos modelos de trabalho no pós pandemia
Por Fernanda Gonçalves Valor
01/03/2024 06h00
Somente 32,6% dos profissionais brasileiros acreditam na preparação das lideranças para os desafios de gestão de pessoas. É o que mostra a terceira edição da pesquisa “O Cenário do RH no Brasil”, realizada em parceria entre a ABRH Brasil e a HR Tech Umanni, obtida com exclusividade pelo Valor.
O estudo ouviu cerca de 900 profissionais, sendo 46,25% oriundos de cargos de liderança, como gerente, supervisor, diretor, vice-presidente e presidente, enquanto 44,4% são assistentes ou analistas. O propósito do levantamento foi entender as principais transformações decorrentes da pandemia e seus impactos nas empresas.
“A liderança precisa melhorar. Existe uma percepção de que os nossos líderes nãoatendem às expectativas, tanto do ponto de vista de quem é liderado quanto doponto de vista de quem está no topo das organizações”, explica
Paulo Sardinha, presidente da ABRH Brasil.
Eliane Aere, diretora de pesquisa da ABRH Brasil, destaca que, hoje, temos relações de trabalho muito mais complexas e, por isso,
o RH precisa ajudar a desenvolver as lideranças. “Um grande desafio do RH é que ele se movimenta pelos olhos e pelas mãos de outras pessoas, que são os líderes dentro das organizações. Porque no final, quem está na ponta, no dia a dia com as pessoas, são os líderes, então ou eles ajudam muito ou atrapalham muito nesse processo de adaptação.”
A pesquisa mostra, ainda, um retorno aos aspectos conservadores no que diz respeito aos modelos de trabalho. “A pandemia exigiu uma série de ações, e se supunha que muitas delas iriam se perpetuar. O exemplo mais clássico é o homeoffice”, pontua Sardinha.
Segundo o estudo, 49,6% das empresas seguem atualmente o formato 100% presencial, enquanto 46,2% estão no regime híbrido. Já o home office integral aparece em 4,2% das companhias.
Na pesquisa anterior, feita em 2018, este modelo estava presente em 23,9% das empresas.
“Hoje, a gente começa a desarticular uma série de pensamentos que nós achávamos que teriam se estabelecido para ficar. Mas, na verdade, estamos retornando ao modelo tradicional de trabalho”, observa o especialista.
No cenário do formato híbrido, 40,4% das empresas preferem uma presença de três dias por semana, seguida por 27,4% que optam por dois dias semanais. Ao mesmo tempo, 18,3% adotam quatro dias presenciais na semana.
“O funcionamento do home office depende de aspectos como segmento, faixa de idade e formação.
A gente não pode mais continuar a falar sobre as relações de trabalho de uma forma generalizada, pois há uma dispersão”, analisa Sardinha. “Já não dá mais para dizer que algo representa 80% do mercado.
As empresas terão que se adequar aos diferentes tipos de funcionários que elas vão precisar contratar”.
Ponto de partida
Sardinha revela que o papel do RH é o de mediar os interesses das empresas e dos empregados. No entanto, tradicionalmente, essa mediação era feita a partir do que a empresa definia. Agora, segundo ele, o RH está mudando o seu ponto de partida.
“Tem o que a empresa quer, o que o sindicato quer e, agora, tem o que as pessoas querem. Portanto, não basta mais o RH implantar algo de forma direcional na empresa”, afirma. “Tem que fazer uma leitura muito criteriosa, porque
a cultura não vai ser mais única e os valores não vão ser mais um conjunto. É preciso decodificar ansiedades e expectativas para que a empresa possa responder.
Tentar reunir interesses legítimos individuais e tornar isso uma forma harmoniosa de trabalharem grupo é um grande desafio”.
Nesse sentido, Aere traça um paralelo com a questão dos benefícios oferecidos pelas empresas aos funcionários: “No passado, o benefício era algo muito mais padronizado. Hoje em dia, as pessoas já querem os seus benefícios de maneira mais individualizada. Por isso, é preciso sensibilidade para as pessoas de recursos humanos, além de capacidade de negociar”, define.
Semana de 4 dias
A pesquisa apontou também que, embora algumas empresas tenham adotado o modelo de jornada de trabalho de quatro dias por semana, a tendência de adesão é baixa.
Apenas 7% dos entrevistados afirmaram praticar a jornada reduzida e 3% disseram ter projetos para implementar o experimento no futuro.
De acordo com Sardinha, reduzir a jornada de trabalho tem um impacto muito grande em termos de custos, o que gera aumento de preços, além de perda de produtividade e competitividade.
“O que nos pareceu é que a ideia foi bem recebida mas, quando foi quantificada, se percebeu que o impacto é muito sério. Quem é que vai pagar o preço? A sociedade está preparada para isso? Vai ter um custo que vai ter que ser repassado. E aí ninguém quer muito correr o risco”, relata.
Na visão de Aere, é natural do ser humano pensar em aumentar o bem-estar e buscar mais equilíbrio, mas, para isso, a sociedade tem que se reorganizar. “Não basta só fazer um projeto. Estamos inseridos numa cadeia”, pondera.
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